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sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Mãos e Luvas

Balançam despercebidas as mãos que procurei por esses dias.
São grandes aquelas que seguraram as minhas na saída no final da noite.
Gosto quando elas tocam meu peito, gosto quando as minhas se perdem entre seus dedos compridos.
Gosto quando gentis elas tocam os meus quadris, e quando caminhamos me abraçam e aliviam meus anseios.
Espero por elas enquanto seguram o copo ou gesticulam suas falas, de longe procuro decifra-las.
Não são tão explicitas quanto às músicas que canta, ou como quando segura outras mãos.
Balançam despercebidas elas duas.
Enquanto uma acena a outra afaga.
Só tateiam meus caminhos quando convêm.
Entrego-me a elas no seu “vai e vem” buscando mais do que elas me oferecem.
E quando elas vão embora
, fico triste, mas sei que reagem conforme minhas particularidades, que pouco sabem sobre dar e receber.
No final da estória se retraem, e na despedida são maiores, enfáticas e desinibidas.
E da esquerda para direita, já vestidas com as luvas da verdade dizem adeus e deixam saudades.

domingo, 19 de agosto de 2007

Perpetuando a cultura da bola de chicletes

Uma de suas particularidades é o gosto por fazer bolas de chicletes.
O motivo do despropósito é que este costume tem propriedades calmantes.
Diante de uma bola de chicletes bem feita, a vida parece mais simples e feliz para ela.
Ela prefere as bolas cor de rosas de sabor tutti-frutti.
O cheiro também tem propriedades terapêuticas, e a faz lembrar da infância que a
remetem a alegria e descomprometimento.
Aos 30 anos, coleciona uma lista de afazeres que contrariam sua vontade sincera, são os “tenho que”, “preciso de”, “vence em”, “marquei com”, e assim por diante.

Entre os “tenho quês” deste final de semana foi surpreendida pela idéia de se eternizar. Ela acredita que a eternidade consiste nas lembranças das particularidades especiais de uma pessoa, que de tão boas ou más, seguem entre as gerações. Estas particularidades podem resgatar prazeres, medos, costumes, tristezas ou alegrias.
Neste caso, ela acredita que se eternizará pelo gosto por bolas de chicletes.
Agora ela se sente feliz sabendo que está perpetuando uma cultura tão pessoal, porque mais uam criança aprendeu a fazer as bolas de chicletes que tanto gosta.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Sete

Ela estava no vagão metrô rumo ao Leste quando ouviu a voz do condutor anunciando a estação. Num salto levantou do banco e desceu.
Talvez naquela tarde seria salva da inércia.
Subiu as escadas rolantes com os olhos atentos e curiosos a procura da figura que descreveram com tanto entusiasmo.
O jovem alto, solitário e ateu, cuja numerologia ela sabia de cor.
Parou próximo as catracas, em frente a S.S.O sentindo-se ridícula, mas logo tratou de espantar o mal-estar, afinal tratava-se de mais uma possibilidade.
Observou as pessoas por algum tempo. Viu alguns grisalhos barrigudos nada parecidos com a descrição da torcida.
O tempo passou e ela se cansou. Olhando o relógio como quem não quer mais esperar, foi embora desapontada.
Pensou em diversas possibilidades, talvez algo mais objetivo. Gostaria que tudo desse certo desta vez, então pensou em emprestar seu corpo a uma alma mais aberta a este tipo de experiência enquanto não se sentia preparada.
Chegando em casa, largou a bolsa no sofá e ligou a TV. Passava um programa deste tipo “Tarde coçando e aprendendo a disfarçar”. Foi ai que ouviu o que seria sua próxima tentativa, com atenção, papel e caneta nas mãos:

Numa noite de lua cheia, lave o corpo do tronco para baixo com água tingida de anilina azul índigo e seque-se com uma toalha virgem. Vista-se com uma roupa sensual e passe um perfume floral com 7 marias-sem-vergonhas maceradas.

Vá a uma encruzilhada, reze 7 vezes o “Credo” as 7 da noite. Siga para um boteco e peça 7 Marias-moles, todas com uma lasca de canela em pau.

Fume um cigarro na esquina da lanchonete e espere 7 minutos.
É infalível!!!

domingo, 12 de agosto de 2007

Sem mais para tanto e por tanto...

... ha anos ela não consegue decidir se segue rumo ao norte ou sul.
Tem ojeriza de qualquer tipo de envolvimento e toma calmantes para dormir.
A ela foi confiada uma vida, mas tem dúvidas também entre dar o mel ou os antibióticos.
Vende sua crise por piedade, cria dó por igualdade.
Encaixota livros que não leu e cataloga sonhos que não viveu.
Satiriza seu dia a dia e caminha no final da tarde para esquecer de lembrar:
Que não mais será maior do que pode ser, nem a dor e nem o próprio ato
de ser.
A dura condição humana consiste em aceitar e conviver
com a escolha, com a auto-piedade, os medos e com os sonhos reais e ilusórios.
E quem não ri de si para viver?
Se eu te olhar no buraco da fechadura, vou te gostar, vou querer rolar e rir com você.
Vou te escrever, vou te contar
que nesta noite sonhei com cenouras podres no ralo do chuveiro;
e que você dormia no chão do banheiro
e eu tentava te acordar.
Seria o teu ou o meu olhar?

As flores que bordei

A noite passada ela se deixou cair no vão entre a rua asfaltada e a calçada. Na velha sarjeta.
Mais uma vez a dor implacável pegou seu peito e massacrou sem dó. A mesma dor que faz visitas rotineiras.
Na manhã seguinte, o resto da dor estampava-se em seus olhos tornando-os ainda maiores e seguiam espantando as pessoas que cruzavam seu caminho nos corredores do prédio onde trabalha.
As perguntas foram muitas e as respostas vagas.
O dia passou como uma folha de papel em branco que voa com o vento no final do bimestre pela rua suja da cidade.
A noite chega e ela sente um lampejo de sua alma quando para na porta da cozinha.
Seguiu para o quarto a procura de pedaços de tecidos velhos coloridos
, tesoura e da linha de bordar que estava escondida no maleiro do guarda-roupas.
Com lágrimas nos olhos e sem querer saber de mais nada, nem da Paula e do Daniel da novela das oito, bordou as flores mais lindas nas pernas de sua calça de sarja queimada pelo ferro de passar roupas.
No dia seguinte, como quem encontrou a paz, seguiu para o trabalho com seus cabelos armados, desfilando as flores que brincavam em suas pernas, mãos e com sorriso de volta.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

Olha a falta que sentir sua falta me faz...!!


As vezes se eu comparo a falta de dinheiro com a falta de carinho, sexo e amor, e a falta de dinheiro se torna insignificante. E as vezes se eu comparo a falta de carinho, sexo e amor com a falta de dinheiro, aí a falta de carinho, sexo e amor é que se tornam insignificantes.


As vezes...

Por uma vida menos ordinária

Ela se preparou naquela manhã para a aula de dança do ventre, aquela que a fez pensar e repensar nas razões, nos porquês e se assegurar de que não se tratava de modismo insensato.
Segura ela se inscreveu.
Ela espera que com isso “aquela vontade de viver” que sentia na infância volte a queimar seu peito a muito congelado.
Arrumou uma calça solta, um top curto (ai um top curto!!!), para movimentar-se bem.

Seu coração estava ansioso e seu corpo também.
O caminho foi tranqüilo. Sentiu-se bem ao chegar na escola e enquanto esperava o início da aula imagina movimentando-se graciosamente.
Durante o alongamento esbarrou-se nas ferrugens de suas juntas, mas manteve-se otimista.
Quando os exercícios começaram, sentiu-se como se estivesse guiando um carro desgovernado pela primeira vez. Racionalizou demais os movimentos se corrigindo a cada passo.
Olhando-se no espelho, via sua imagem bastante roliça e despreparada para o desafio e concluiu que nunca conseguiria ter a doçura sensual das dançarinas do ventre.
Apesar da conclusão, terminou a aula animada.
Na próxima semana tentou começar com o otimismo inicial.
Chegando na escola, se deparou com outras alunas do “nível intermediário”, que julgou mais belas, magras e delicadas – foi o fim!
Sentiu-se ridícula! Passou a aula atropessando nos próprios pés, a dureza de seu corpo sobrepunha qualquer tentativa de libertar-se.
Na saída pediu para mudar de horário. A professora compreendeu sem dificuldades, e assim ficou combinado.
Na semana passada, já sem expectativas, se deu uma nova chance.
E durante a aula chegou a uma conclusão que julgou extraordinária:
“Preciso de paciência, bons olhos para me ver e muita fé na vida, porque água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”.

Tudo por uma vida menos ordinária!